sábado, 10 de dezembro de 2011

Carl Barks e o mundo que eu sonhei

A cantora italiana Laura Pausini conta em seus shows que a canção ‘Il Mondo Che Vorrei’ foi a primeira que ela escreveu totalmente sozinha. Tive a felicidade de assistir ao vivo a sua performance no ano de 1997, quando ela passou por Porto Alegre com a turnê do disco “Le Cose Che Vivi”, então recém lançado. Como sugere o título, a música fala de problemas sociais e do desejo dela de ver a resolução dos mesmos, para que o mundo, enfim, se torne um lugar melhor. Muitos sabem que, de tão engajada na causa dos desfavorecidos, Laura se tornou embaixatriz da UNICEF na Itáila. “Il Mondo Che Vorrei” faz parte do DVD gravado em 2001 e ainda hoje é executada em seus concertos pelo mundo.



Carl Barks, que viveu entre 1901 e 2000, foi um desenhista americano, criador de muitos personagens que até hoje são, por muitos, atribuídos erroneamente ao próprio Walt Disney; entre eles, o célebre Tio Patinhas, os atrapalhados bandidos Irmãos Metralha, o sortudo Gastão e a feiticeira Maga Patalójika (assim mesmo, com “J” e “K”). Conforme ele mesmo contava, a infância de Carl fora bastante isolada, tendo como único amigo o próprio irmão, mas com quem não mantinha lá grande identidade. Com toda a probabilidade, essa época fora decisiva, do ponto de vista imaginativo do menino que se tornaria criador de uma cidade inteira – Patópolis.


Acho que Laura e Carl nunca se encontraram pessoalmente; o que, aliás, torna ainda mais incrível o número de coisas que talvez tenham tido em comum, sem nunca saberem; sempre me chamou a atenção a capacidade de pessoas que nunca sequer souberam da existência uma da outra terem pensamentos em comum; por mais que nesse caso, o bem seja um desejo universal, é, ainda assim, igualmente notável; ainda mais se levarmos em conta que, ao contrário do que acontece nos quadrinhos e nas canções, na vida real, nem sempre o bem vence no fim.


Penso que Laura Pausini seria um fenômeno de vendas de discos na cidade de Patópolis, se esta existisse realmente; principalmente porque lá, com certeza não existiria produto pirata; isso porque o coronel Cintra e seus homens estariam sempre prontos a rechaçar qualquer entrada de produto ilegal em território patopolense – possivelmente, contrabandeados pelos Metralhas que, mais uma vez, acabariam atrás das grades. Enquanto Donald e Margarida namorariam na rede, ao som de “Strani Amori”.


Tal como na canção de Laura, no mundo que Carl sonhou, havia mais justiça; Mancha Negra, a despeito de toda a ardilosidade e astúcia, sempre acabará na cadeia e nem mesmo todo o conhecimento sobre magia será capaz de ajudar a Maga a roubar a moedinha número um; no mundo de Carl, cedo se aprende que o crime não compensa; e que as novas invenções devem ser sempre usadas unicamente para o bem comum, como ensina o professor Pardal; em Patópolis, mal de Alzeihmer e AVC são invenções de médico; por isso tio Patinhas nunca deixará de ser lépido, disposto e ágil e o professor Ludovico, quanto mais viver, mais sábio será.


No mundo que Laura, Carl, você leitor, e eu sonhamos, Huguinho, Zezinho e Luisinho jamais serão Hugo, José e Luis; serão para sempre crianças, educadas, respeitadoras e estudiosas; apesar de viverem com o tio e não com os pais, nunca será preciso mandar chegar cedo em casa e não andar em má companhia; eles sabem que devem contar a Donald quando algum adulto vier oferecer dinheiro em troca de favores sexuais; os trigêmeos nunca chegarão perto de maconha, ou coisas piores, nem farão downloads ilegais; música para eles, é sertanejo universitário ou (por influência do milionário tio-avô) rock anos 80-70-60; Funk? “Não, obrigado”, respondem os três em uníssono quando lhes oferecem alguma transferência, via Bluetooth; em Patópolis as rádios não tocam funk, porque ninguém ouve funk; e o que é melhor, sem necessidade de censura!

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