terça-feira, 2 de outubro de 2012

Obra do acaso

O ano era 1997; lembro que era inverno e naquele dia caía uma chuva fina e insistente, típica da estação; eu estava sentado no saguão da sede do meu então novíssimo curso de informática e, para ver a rua, tinha que olhar para a minha direita, através das enormes portas de vidro; dali a pouco eu iria entrar para mais uma aula e, como naquele tempo eu ainda não tinha PC em casa, esperava por aquelas horas semanais em frente ao computador com grande ansiedade e as aproveitava ao máximo; fiz alguns bons amigos, que depois, as circunstâncias da vida me tiraram, como às vezes acontece; mas sem dúvida, aqueles nove meses de cursinho são até hoje uma fabulosa e marcante lembrança daquele distante 1997.

É impressionante como as grandes lições deixam marcas para sempre! E o mais interessante (que é também o que quero contar hoje) é que a referida lição nem teve a ver com informática de fato. Ocorre que nesse mesmo dia que citei, eu entrei na sala de aula com uma latinha de refrigerante e a depositei em cima da mesa, bem ao lado do PC; ao que André, o instrutor, prontamente me informara que tal não era permitido; tentei então argumentar que não havia a menor possibilidade de eu derrubar o líquido, atingindo o computador - motivo da proibição; mas eis que André contra argumentou da seguinte forma:

- É claro que ninguém vai fazer uma coisa dessas de propósito - concordei com a cabeça - e sem querer tudo pode acontecer.

Mais do que ter saído da sala para acabar de beber o refrigerante e só então ter voltado, ficou em mim o aprendizado implícito na situação: que coisas ruins podem acontecer, sob o pretexto de não ter havido intenção de causar prejuízo! Quantos episódios  (desde pequenos incidentes até desastres incalculáveis) podem ser evitados, bastando para isso que se use a prevenção; como diz o ditado: é melhor do que remediar.

Sob o pretexto do "sem querer", pessoas nascem (e morrem!) ocorrem acidentes no trânsito, em família e em parques de diversões; no futebol, um gol contra (marcado, é claro, sem querer) costuma ter consequências danosas, quando não trágicas; afinal, quem não se lembra do triste caso do zagueiro colombiano Escobar, assassinado na porta de uma danceteria em Medelín, supostamente por causa de um gol contra, marcado na copa do mundo de 1994? Também Roberto Bolanõs, o Chaves, deu sua contribuição ao não premeditado ao imortalizar a expressão "foi sem querer querendo"; talvez aí esteja mesmo a melhor forma de se tentar compreender os males causados pelo acaso: a criança que tenta se justificar o erro com a peculiar inocência; mas isso, acrescente-se, só vale para crianças.

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