domingo, 6 de maio de 2012

Feliz aniversário

Hoje é primeiro de Maio, aniversário do Leco. Mas esperem um pouco; essa historia precisa ser mais bem contada...



O ano era mil novecentos e oitenta e oito; o Brasil ainda reclamava da inflação; na TV, a geração pré bunda ensaiava timidamente os primeiros passos do humor sem educação e sem qualidade ao qual estamos acostumados hoje; sonhávamos com um Escort XR3 conversível; usávamos tênis Conga ou Quichute; ouvíamos Legião Urbana, RPM, Madonna, Erasure, New Order e Roxette; se você foi criança naquela época, é muito provável que pertença à última geração que realmente tem motivo para sentir saudade da juventude; impossível não sentir o coração bater mais forte ao lembrar daqueles dias!


Particularmente, tenho também minhas recordações. Alequis entrou na minha vida no segundo ano escolar e por seis anos dividiu comigo o titulo de melhor aluno da sala; em um ano, ele foi o melhor em matemática; no outro, eu fui o melhor em português; num ano, ele tirou mais notas 10; no outro, fui eu; e assim, enquanto o Brasil perdia a copa de 90 na Itália e a guerra fria chegava ao fim entre outros fatos marcantes, a turma 51 da escola Alcebíades dos Santos ia também escrevendo as suas páginas no livro da vida, em uma pequena cidade da região metropolitana de Porto Alegre.


A rua onde Alequis morava sempre me pareceu pertencer a alguma espécie de portal do tempo; mesmo hoje, quando por ela passo, alguma coisa acontece no meu coração – como diria o poeta. Ali, na frente da casa da Flávia, que também era nossa colega, fazíamos as goleiras do futebol, com pedras, camisas amontoadas ou o que estivesse à mão. O pai de Alequis tinha um armazém, o que significa dizer que nós comíamos bala de goma a tarde toda. Quando não havia mais meninos, brincávamos apenas Alequis e eu; isso quando eu obtinha permissão para ir até lá, pois a casa de Alequis ficava longe da minha – na visão da época, a três quadras de distância!


Aquele foi um tempo mágico! Uma das coisas que marcou, pelo menos para mim, a passagem de nossa infância para a adolescência foi uma espécie de Dream Team que Alequis montou comigo e mais dois colegas da sala, já lá pelo sexto ano; Cesar e Juliano juntaram-se a nós e ficamos conhecidos na escola como os 4 cavaleiros do Apocalipse; essa turma então passou a se reunir na casa de Alequis para jogar vídeo game e dar uma folheada em revistas de conteúdo adulto. Às vezes, nos reuníamos na casa de Cesar, que tinha mesa de pingue pongue na garagem. Nessa época eu já não tinha tanta dificuldade em obter junto à minha mãe, permissão para ir visitar meus amigos.






Eu realmente não me lembro em que momento deixei de pedir para a minha mãe permissão para ir visitar Alequis, ou simplesmente Leco; o auto intitulado “Kevin Leco”, que arrancava suspiros das meninas da sala imitando os trejeitos do ator que protagonizou a refilmagem do grande clássico em 1990; o Leco, assumidamente apaixonado pela professora de matemática (seria essa a razão de tamanha dedicação na disciplina supracitada?) o Leco, que ninguém queria enfrentar na rede, nos jogos de voley na educação física e no ‘cinco corta’ nos recreios; o primeiro de nós que começou a se vestir com roupas de corte mais adulto; o mesmo Leco que disputava com o Wagner a artilharia do futebol, dava cola e pedia cola, nas provas; amado por elas, odiado por eles; menos eu, é claro. Esse era o Leco.


Foi esse mesmo Leco que me veio à memória nesta tarde de fina garoa, em que mais uma vez, passei na rua dele; na esquina em que nos despedíamos todos os dias depois da aula, cada um com seu walkman; e olhei para o alto do morro que faz a divisa do bairro; aquele morro que despertava a nossa curiosidade sobre o que haveria do outro lado dele; hoje sei que não há nada; o walkman virou mp3, somente as músicas ainda são as mesmas. Flávia não mora mais lá, a rua foi pavimentada e o cenário todo recebeu as modificações que a inevitável adequação à vida moderna exige; todo aquele universo virou saudade, nostalgia ou o nome que você que está lendo agora, quiser dar, pois isso eu sei, também aconteceu com você, só que foi em outro lugar e com outras pessoas.


O Leco atual é marido e pai; sua filhinha deve estar agora com três ou quatro anos; graças à internet, hoje ninguém mais perde contato com ninguém (a menos que queira), de modo que falo com Leco por e-mail, sempre que me é possível; devo confessar, no entanto, que faz algum tempo que não lhe escrevo nada; por isso estou escrevendo esta; para desejar-lhe, amigo, onde quer que esteja, um feliz aniversário; e agradecer, embora eu saiba que dizer ‘obrigado’ é pouco, por tudo o que você me ensinou e pelo quanto tudo isso me ajudou a ver a vida com mais sentido e a formar o ser humano que me tornei; eu não mudaria um só dia de todos aqueles anos que passamos juntos; porque em qualquer historia, são as primeiras páginas as mais importantes.


Hoje é primeiro de Maio, dia do trabalho; e do amigo.


Um comentário:

Bau da Bia disse...

Gostei muito do seu blog Luciano! Esse texto me remeteu a infância que pelo visto foi semelhante a tua... Com um pouco mais de tempo, vou lendo mais coisas aqui...

Bjoss